Page 258 - Uberaba-200 anos no coracao do Brasil
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Não bastassem os horrores da guerra e a dificuldade de transpor grandes distâncias por terra, a varíola
também acometeu os voluntários da Pátria, que conforme os relatos da época foi uma das mais sanguinárias
guerras da história do Brasil. Hildebrando de Araújo Pontes relata a epidemia de varíola que acometeu as tro-
pas em 1865, abaixo:
[...] Mal chegaram a Uberaba os soldados do Coronel Drago, eis que dentre deles
irrompe, violentamente, a epidemia da varíola empolgando toda a brigada e grande
parte da população da cidade que tinha doentes em cada um dos seus cantos.
Nas casas atingidas pelo flagelo colocava-se acima da porta da rua, um pedaço de
pano negro quadrado para servir de aviso.
Reinava a maior desolação na cidade, por cujas ruas ninguém mais transitava e, por
fim, permaneciam desertas dias e dias seguidos. Os roceiros aqui não vinham mais e o
comércio paralisou-se, inteiramente.
[...] Os bexiguentos militares eram tratados no Hospital da Misericórdia pelo padre
Tristão, excelente enfermeiros e prático de farmácia, e os civis em suas próprias casas
pelos da família.
[...] Na cidade havia dois médicos: o Dr. Joaquim Pedro, de Paracatu, e o Dr. Henrique
Raymundo Des Genettes, além do farmacêutico Antônio Trevões.
Havia, ainda, pessoas abnegadas que tratavam os doentes alheios, ou os que não tinham
ninguém por si, dentre elas se contavam o Capitão Fabrício José de Moura, Joaquim
Garcia de Souza Paiva e as serviçais Dorothéia e Candinha do Bernardo Relógio.
[...] Morreram numerosos soldados e alguns civis; ao todo, talvez umas trezentas
pessoas nos três meses de duração da epidemia.
Os corpos foram enterrados no cemitério de São Miguel, à direita entrando-se; razão
porque aquele lado ficou interdito por mais de um quarto de século.
(PONTES. Vida, Casos e Perfis. p. 51 e 52)
O historiador Borges Sampaio relata em seu livro Uberaba: História, Fatos e Homens o seu trabalho em
prol da organização de forças para a Guerra do Paraguai:
NA GUERRA COM O PARAGUAI
Na organização de forças para Mato Grosso em 1865 em Uberaba, o Presidente da
Província de Minas, Conselheiro Pedro d’Alcântara Cerqueira Leite, incumbiu-me de
vários serviços, para a reunião e sua marcha.
Comissões foram nomeadas para, de quinze em quinze quilômetros, haver suprimento
de víveres até Santa’Ana do Paranaíba (setenta e duas léguas). Estas fizeram os
abastecimentos, dos quais as forças não se puderam aproveitar, porque o Coronel
Manuel Pedro Drago deliberou, à última hora, tomar à direita pelo Rio dos Bois. A
organização das aludidas comissões e a de um itinerário da marcha, desde Sant’Ana
até Caiaba estiveram a meu cargo.
Também as forças não aproveitaram de duas barcas que mandei construir naquele
ponto para transporem o rio; as quais foram feitas por operários, que só muito tarde
recebi.
A epidemia da varíola assolou então a cidade, que ficou deserta; penetrou o mal
nas prisões, quartéis, casas que serviam de hospitais e nas dos particulares. Foi-me
preciso prover como delegado de polícia sobre tratamento e enterramentos. Provi sem
descanso, como era possível prover, sob a carência de recursos de toda a sorte, mas
muito sacrificado.
Despendi com isso quantias avultadas com relação ao meu minguado recursos, das
quais prometeu a tesouraria da Fazenda embolsar-me, mas não fui embolsado.
A meu cargo estiveram - a designação de guardas nacionais para marcharem; a
substituição de alguns; o aquartelamento de designados e de recrutas; o alistamento
de voluntários.
O Conselheiro Joaquim Saldanha Marinho, substituindo o Conselheiro Cerqueira
Leite na presidência, ainda me encontrou no desempenho de muitas destas funções,
incumbindo-me outras.
Neste labor, que perdurou cerca de seis meses e que hoje não sei como pude
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