Page 262 - Uberaba-200 anos no coracao do Brasil
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havendo o Paraguai atacado e invadido, simultaneamente, o Império do Brasil e a
República Argentina, achavam-se, decorridos dois anos, após tal investida, reduzido a
defender o próprio território, invadido do lado do sul, pelas forças conjuntas das duas
potências aliadas, a quem coadjuvava pequeno contingente de tropas da República
do Uruguai. Ao sul oferecia o caudaloso Paraguai mais vantagens à expugnação da
fortaleza de Humaitá, que, pela posição especial, se convertera na chave estratégica do
país, assumindo, nesta porfia encarniçada, a importância de Sebastopol, na Campanha
da Criméia.
Ao norte, do lado de Mato Grosso, eram as operações infinitamente mais difíceis, não
só porque ocorriam a milhares de quilômetros do litoral atlântico, onde se concentram
todos os recursos do Brasil, como ainda por causa das inundações do rio Paraguai, que
cortando na parte superior do curso terras baixas e planas, transborda anualmente, a
submergir então regiões extensíssimas. Consistia o plano de ataque mais natural em
subir as águas do Paraguai, do lado da Argentina, até o coração da república inimiga e,
do Brasil, descê-las a partir de Cuiabá, a capital mato-grossense que os paraguaios não
haviam ocupado.
Teria impedido à guerra arrastar-se durante cinco anos consecutivos esta conjugação
de esforços simultâneos. Mas era-lhe a realização extraordinariamente difícil, devido
às enormes distâncias a transpor. Basta lançar os olhos sobre um mapa da América
do Sul e examinar o interior do Brasil, em grande parte desabitado, para que qualquer
observador de tal se convença logo.
No momento em que se enceta esta narrativa, estava, pois, a atenção geral das
potências aliadas quase exclusivamente voltada para o Sul, para as operações de guerra,
travadas em torno de Curupaiti e Humaitá. Quanto ao plano primitivo fora ele mais ou
menos abandonado; quando muito ia servir de pretexto a que se infligissem as mais
terríveis provações a uma pequena coluna expedicionária, quase perdida nos imensos
e desertos sertões brasileiros.
Em 1865 – ao arrebentar a guerra que Francisco Solano Lopes, o presidente do Paraguai,
na América do Sul suscitara sem maior motivo do que os ditames da ambição pessoal;
quando muito a invocar o vão pretexto da manutenção do equilíbrio internacional – o
Brasil, obrigado a defender honra e direitos, dispôs-se, denodadamente, para a luta. A
fim de reagir contra o inimigo, em todos os pontos onde podia enfrentá-lo, o plano da
invasão do Paraguai setentrional acudiu naturalmente a todos os espíritos; preparou-se
uma expedição para este fim.
Não foi infelizmente este projeto de diversão realizado nas proporções que sua
importância exigia; e, mais infelizmente ainda, os contingentes acessórios sobre
os quais contávamos, para avolumar o corpo de exército expedicionário, durante
a longa jornada através de São Paulo e Minas Gerais, falharam em grande parte ou
desapareceram devido a cruel epidemia de varíola e as deserções que esta provocou.
Marchou-se lentamente: provinha a demora de muitas causas, sobretudo da dificuldade
do abastecimento de víveres.
Foi somente em julho (partira do Rio de Janeiro em abril) que a coluna pôde
organizar-se em Uberaba, chegando-lhe os quadros a atingir cerca de três mil
homens. Reforçavam-na vários batalhões que, de Ouro Preto, trouxera o coronel José
Antônio da Fonseca Galvão.
Não sendo esta força ainda suficiente para uma ofensiva, seu comandante, Manuel
Pedro Drago, encaminhou-a para a capital de Mato Grosso, a fim de avolumá-la. Assim
se adiantou em direção ao noroeste, até as margens do Paranaíba, quando ali recebeu
peremptórias ordens do governo, levando-lhe instruções formais de marchar para o
distrito de Miranda, então ocupado pelo inimigo.
Tal injunção, no ponto a que chegávamos, impunha como forçado corolário obrigar-
nos a descer em direção ao rio Coxim e a contornar em seguida a serra de Maracaju,
por sua base ocidental, anualmente invadida pelas águas do Paraguai. Assim, pois,
estava a expedição condenada a atravessar extensíssima região emprestada pelas
febres palustres.
A 20 de dezembro atingiu Coxim, ainda sob o comando do coronel Galvão,
recentemente investido da chefia e, pouco depois, graduado em brigadeiro.
Embora sem valor algum estratégico, tinha pelo menos o acampamento do Coxim uma
altitude que lhe garantia a salubridade. Não tardou, porém, que a enchente havendo-o
ilhado e isolado, ali passasse a força pelas mais cruéis privações, sofrendo até fome.
Após longas hesitações, forçoso se tornou romper ao acaso, através do pestilento
pantanal, onde a coluna foi desde o princípio provado pelas febres. Uma das
primeiras vítimas veio a ser o próprio e infeliz chefe, falecido à margem do rio Negro.
Afinal, arrastando-se penosamente, conseguiu atingir a povoação de Miranda a 396
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