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quando nos despedimos, eu ia para o           lá na frente do motor, acionar uma
                      internato. Hoje, com mais de noventa          manivela até que o motor “pegasse”.

                      anos, fico sem saber explicar como eu         Era sempre uma tragédia. Logo junto
                      me apaixonava tão facilmente.                 ao volante, havia duas pequenas
                                                                    alavancas, uma para o avanço e outra
                     Mudança para a                                 para acelerar. Em baixo, havia três

                              cidade                                pedais, um para a marcha à ré, outro

                                                                    funcionava como breque, o terceiro

                   Em 1930, Quita, grávida nova-                    não me lembro. A buzina chamava-
               mente, veio para a cidade para dar à                 se “perereca” e os dois faróis eram
               luz com mais conforto. Matricularam-                 de carbureto, um problema para as

               -no na Escola Alaor Prata, onde estu-                viagens à noite. Era preciso acelerar
               dou por dois meses antes de retornar                 forte para que funcionassem. A
               para a Estiva. A professora era Sylvia               capota era de lona. Meu pai chamava

               Rodrigues da Cunha. Nessa ocasião                    o carro de “máquina”. Outras vezes,
               moravam numa casa alugada, na Rua                    íamos ao Centro num caro de praça,

               Floriano Peixoto, número 5. Foi lá que               eram os taxis da época. Lembro-me de
               o seu irmão, Hugo, nasceu. Em seu li-                um chauffeur (assim eram chamados
               vro de memórias, Padre Prata guarda                  os motoristas), o Abner. Geralmente

               lembranças significativas deste perío-               levava uma espingarda. Pequenos
               do, comparando-o com a atualidade:                   veadinhos campeiros, frequentemente

                                                                    atravessavam a estrada. O Abner os
                      Como é fácil hoje e como era difícil          abatia. Para nós era uma aventura,
                      naqueles tempos. Quando mamãe                 um mundo que não existe mais. O

                      dava à luz ou por um motivo de                fordinho, correndo a 30 por hora, era
                      doença mais séria, íamos ao Centro            um sonho.

                      –  como  chamávamos  a  cidade  de
                      Uberaba.  Tempos atrás, a única          Traumas de infância
                      condução era o carro de boi. No

                      meu tempo, as coisas melhoraram.          Uma das lembranças que mais o
                      Meu  tio  Zequinha  tinha  um  Ford    aterroriza se relaciona a soldados de-

                      fabricação 1018, chamava-se Ford de    vido a acontecimentos vividos por
                      bigode. Ignoro os motivos do apelido.   Thomaz naquela época. Em pri-
                      Para fazê-lo funcionar, era preciso ir   meiro lugar, há uns 50 metros da



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