Page 52 - Rev Memorias_Pe Prata_2
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eucalipto e a casinha de um João de
barro que morava alí a anos. Por que
gravei essas minúcias? A cocheira foi
ficando para trás, também o córrego
onde pescava meus lambaris e minhas
cambevas. Olhei para trás mais uma
vez. Só ia o pomar ficando cada vez
mais distante. Comecei a chorar
baixinho. Estavam me levando para o
Seminário. Ia estudar para ser padre.
Passamos perto da vendinha do Sr.
Felipe Bittar. De lá abanavam as
mãos a Chamis, o Toninho, a Odete,
a Onofra, a dona Vulica. Estranho!
Não me lembro do automóvel nem
do chauffeur. Porque me foge esse
detalhe? Não sei. Eles estavam me
levando para longe da Estiva, me
arrancando daquela terra em que Primeira foto no Seminário - Ano 1935
pisei durante doze anos. Eu ia para Ouvia gente repetindo “que coisa
o Seminário. O que significava ser boa para você”. Mas eu não sabia
padre? Eu não sabia. Lembro-me que coisa boa era essa. O que eu
apenas que me davam os parabéns e conhecia de coisa boa era a Estiva,
diziam que escolhi um bom caminho. minha vaca Boa Noite, meu cavalo
Ficava pensando que caminho seria Eclipse, minha cadelinha Lila. À
aquele? Eu me achava importante. tarde, saímos à rua para comprar meu
Mas muito triste. (Não estou tentando enxoval, calças curtas, camisas, meias,
afirmar que me arrependi. Nem por sapato, chuteiras, pente, dentifrício,
um momento me arrependi de ter escova, sabonete, essas coisas de uso
me ordenado padre. Os caminhos de diário. Logo depois me levaram para
Deus são muito estranhos. Sou feliz conhecer o Seminário. Aquele casarão
em ser padre). Chegamos em casa estava vazio. Os seminaristas estavam
de minha avó Sinhá para o almoço, de férias. Vi apenas um deles, disse
ao meio-dia. Todos me abraçavam. que se chamava José Hugo Fleury
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