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PADRE PRATA – De início, quero            livraria recebeu uma coleção de folhe-
                   deixar bem claro que o Padre Laje não         tos (edições da UNE) e pediram-me
                   pregou nenhum tipo de comunismo               que eu os examinasse. Antes que o ti-

                   nem ideias erradas. Fez um discurso           vesse feito, a responsável pela livraria
                   inflamado bem ao estilo dele, falando         apresentou-me uns três dias depois,

                   das injustiças que sofrem os operários.       um recorte do jornal “O Diário” onde
                   Para muita gente, infelizmente, falar         esses livros eram apresentados como
                   sobre justiça é comunismo.                    incluídos dentro de uma linha de pen-

                       CAPITÃO MÁRCIO – É verdade                samento marxista. Também esses fo-
                   que o senhor encomendou livros co-            ram retirados do mostruário. Quero
                   munistas através de uma livraria da           acrescentar que todos esses livros fo-

                   cidade?                                       ram vendidos numa outra livraria da
                       PADRE PRATA – É verdade, en-              cidade. Foi o que houve, senhor Ca-
                   comendei vários livros. Eu precisava de       pitão.

                   uns dados sobre natalidade e mortali-            CAPITÃO MÁRCIO – Além de
                   dade infantis. Estava fazendo um es-          suas aulas, o Sr. fez outras pregações

                   tudo sobre a composição etária da po-         aos estudantes. O que o Sr. ensinava
                   pulação brasileira e, disseram-me que         nessas aulas?
                   num daqueles livros eu encontraria               PADRE PRATA – Sempre faço

                   estatísticas recentes. Encomendei não         pregações. Como padre, eu tenho que
                   apenas um, mas três exemplares. O li-         pregar o Evangelho. Todos os domin-

                   vro chamava-se  “321 Perguntas feitas         gos, às dez horas da manhã, na igreja
                   a um brasileiro”. Lendo, percebi logo         de Santa Rita, eu celebrava o que cha-
                   que o autor ventilava teses marxistas,        mávamos de “Missa do Estudante”.

                   era realmente um livro “comunista”,           Exclusiva para os estudantes secun-
                   como muita gente gosta de dizer. Pro-         dários. O que eu pregava era sobre o
                   curei a responsável pela livraria, Dona       Evangelho do dia, não podia ser dife-

                   Escolástica, e sugeri a ela que retirasse     rente. O que acontece é que o Evan-
                   os livros dos mostruários. O que foi          gelho  assustava  certo  tipo  de  gente
                   feito de imediato.                            que ainda confundem Evangelho com

                       Quanto ao outro livro, “Como se-          subversão e a Doutrina Social da Igreja
                   ria o Brasil Socialista”, eu não o li nem     com socialismo cristão, prova de que

                   pedi que fosse encomendado. Neste             não entendiam nem uma coisa nem
                   sentido, o que houve foi o seguinte: a        outra.  Não  tenho  essas  pregações  es-



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